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Foto retirada da internet |
O direito moderno tem falhado enquanto instrumento de solução de conflitos, uma vez que tem sido cada vez mais difícil estabelecer consensos interpretativos sobre dispositivos normativos legais e constitucionais.
Na última década, sobretudo, grande parte da jurisprudência brasileira foi modificada pelo Supremo Tribunal Federal, muitas vezes com a mesma composição e durante um intervalo curtíssimo de tempo. Basta notar o que recentemente aconteceu com a interpretação acerca do prazo prescricional para ações de ressarcimento ao erário, com decisões conflitantes no espaço de poucos dias.
O fenômeno que hoje se observa no Direito Constitucional é há muito tempo conhecido pelo Direito Eleitoral, que possui o agravante de constantemente ver a composição de suas cortes modificadas, uma vez que os que ali estão cumprem apenas breve mandato.
Um dos temas que sempre foi alvo de polêmica diz respeito às hipóteses de inelegibilidade do vice, seja prefeito, governador ou presidente, em razão da emenda que permitiu a reeleição à chefia do Poder Executivo. Tal emenda alterou a redação do §5º do art. 14 da Constituição, mas não o fez de outros dispositivos a eles correlatos. É o caso do §7º do mesmo artigo, o que sempre ocasionou uma série de situações polêmicas, que incessantemente tiveram solução final no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Recentemente, em razão de notícia de inelegibilidade proposta pelo MDB local ao Ministério Público, levantou-se uma suposta impossibilidade de o atual vice-governador do estado do Maranhão ser candidato nas eleições vindouras. O motivo? Teria substituído o governador, que se encontrava em missão oficial em outro país, no período de seis meses anteriores à eleição. A confusão decorre de uma interpretação completamente equivocada dos dois dispositivos acima citados.
Em verdade, o TSE nunca precisou se posicionar sobre essa questão porquanto nunca havia sido ele alvo de polêmica. Todos os precedentes utilizados pelo MDB não afirmam que vice que substituiu o titular não pode ser novamente vice. O que diz o TSE é que vice que substitui, se for candidato a titular na eleição subsequente, só pode sê-lo por uma vez.
Ou seja, se o vice-governador Carlos Brandão saísse agora candidato a governador, caso eleito, em tese não poderia ser candidato a governador novamente em 2022. O problema de toda falsa controvérsia é que deturpam essa conclusão para dizer que agora, em 2018, ele só poderia ser candidato a titular. É óbvio que não é assim!
Acrescem-se situações concretas. Geraldo Alckmin, atual candidato a Presidente da República, foi eleito vice-governador de São Paulo em 1994 e reeleito em 1998. Com uma curiosidade: o então governador Mário Covas se afastou do cargo de Governador mediante licença entre 6 de julho e 30 de outubro. Durante todo esse período, Alckmin exerceu o mandato de Governador como substituto do titular. Ainda assim, foi candidato a reeleição sem que ninguém ousasse dizer ser ele inelegível.
Parece distante? Eis uma situação mais recente. Na eleição presidencial mais judicializada da história da República, o atual presidente Michel Temer, então candidato a reeleição como vice-presidente, assumiu a presidência interinamente em 29 julho de 2014, em razão de viagem de Dilma para Cúpula dos Chefes de Estado do Mercosul. Isso tudo ocorreu com pedido de registro protocolado e em plena campanha. Não houve qualquer questionamento, antes, durante ou depois desse fato.
A razão parece simples e de fato é: não se pode interpretar textos legais para chegarmos a conclusões esdrúxulas, que ferem a lógica do sistema. Mesmo com a colcha de retalhos da Constituição e do sistema eleitoral brasileiro, sempre se deve buscar dar lógica às situações analisadas. Nenhuma interpretação pode simplesmente punir o vice‑presidente, o vice‑governador ou o vice‑prefeito pelo exercício de sua missão constitucional.
A utilização do Poder Judiciário como instrumento de mobilização partidária prejudica não só as nossas instituições, que sabidamente são testadas a cada nova crise, como estimula a descrença dos cidadãos em relação a elas. Precisamos que os grupos políticos se organizem para qualificar o sistema eleitoral, respeitando suas regras e não utilizando um malabarismo interpretativo para corrompê-las.
Interpretar não é um ato de vontade. Decidir também não. Os textos são claros e a deturpação deles também. Que a Justiça seja breve para resolver tal caso, de interpretação aparentemente tão simples, mas que no Maranhão virou bandeira de campanha.
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