Oito artistas maranhenses negros elaboram painéis que irão compor o Monumento à Diáspora Africana no Maranhão, que resgatará o enraizamento cultural deixado na culinária, na fé, na dança, nos ofícios e nos modos de fazer
A Praça das Mercês abrigará o Monumento à Diáspora Africana, que busca visibilizar a contribuição do povo negro para a cultura e a identidade do Maranhão. No dia 30 de novembro, no mês da Consciência Negra, um grande evento marcará a inauguração deste importante Monumento, que contará com a presença de grupos culturais, religiosos e convidados, além do show do nigeriano nativo do povo yorubá Ídòwú Akínrúlí, que se apresentará com artistas locais. Toda a programação é aberta ao público e começa a partir das 17h30.
O projeto que cria o Monumento e requalifica a Praça das Mercês tem patrocínio do Instituto Cultural Vale, via Lei Federal de Incentivo à Cultura, e realização da Prefeitura de São Luís, por meio da Fundação Municipal do Patrimônio Histórico (Fumph). Para a construção de todo o trabalho, uma uma comissão foi criada composta de pessoas envolvidas nos movimentos negros e por estudiosos especializados nos temas relacionados ao monumento.
O Monumento à Diáspora Africana
é composto de oito painéis, 6m x 4,80, que estão sendo produzidos por artistas negros
maranhenses que vêm se destacando nacionalmente no campo das artes visuais. Além
desses, outro painel, em granito negro com 45 metros de comprimento, terá informações
sobre as datas, os nomes dos portos de embarque, os nomes dos navios e a
quantidade de africanos de diversas nações desembarcados no Maranhão entre os
anos de 1693 a 1841.
Em cada paínel os artistas
trabalharam a partir de um tema, que se relaciona diretamente com o protagonismo
do povo negro, suas contribuiçoes formadas a partir do seu processo de (re)
adaptação nos territórios onde vivem e/ou atuam. A diversidade de técnicas
utilizadas e o potencial de comunicabilidade da arte produzida serão atrativos
que se destacarão.
Os temas abordados nos oito
painéis foram trabalhados pela equipe da Fumph e pela comissão, são: Baobá:
origens diaspóricas; Matrizes Africanas: religiosidades; territorialidade: pertencimento
ao lugar; Culinária: afeto e empoderamento; Tecnologias Africanas: base e
inspiração; Arte e Cultura: expressões, memórias e heranças; Intelectualidades
Negras e (Re)Existências: historicidade e militância.
Entre os artistas
selecionados está a multiartista independente Tassila Custodes, conhecida por
Emi Ajé Dudu. A ludovicense apresenta ao público trabalhos que proporcionam
pensar a arte, território, ancestralidade e expansão de consciências a partir
de referências de matrizes africanas, traçando investigações sobre seus
ancestrais longínquos e antepassados. Para o memorial, trabalha o tema “Baobá”,
em um paniel elaborado com tinta acrílica.
“O poder de construir novas narrativas, bem fundamentadas, é o que me motiva. Acredito que a memória é o que nos move, o Baobá é tido como a árvore que atravessa 9 céus (9 oruns). Também dentro do baobá habita o espírito mais antigo da terra. Nesta arte faço uma relação entre árvores, existências, consciências e beleza. Me sinto muito agraciada por vivenciar um momento tão especial onde a nossa memória é honrada em um monumento. Acredito que nascemos justamente para isso, para encontrarmos novos caminhos. Caminhos positivos que sanam as feridas antigas. Obviamente, sem esquecer ou até mesmo sem romantizar todo o processo criminoso que nossos antepassados foram submetidos”, afirmou a artista.
Também estão desenvolvendo painéis na Praça das Mercês nomes como: Gê Viana, Eduardo Inke, Dinho Araújo, Telma Lopes, Origes, Marcos Ferreira e Jesus Santos.
Para a entrega do monumento, também está programada uma Conferência com Rosane Borges jornalista, escritora e professora que é maranhense, mas hoje vive em São Paulo, e com o Kazadi Wa Mukuna que é entomusicólogo e orientador. Terá a mediação do Professor Doutor Carlos Benedito que é professor da UFMA.
A programação conta ainda com o lançamento de uma cartilha educativa, com ações de educação patrimonial, o que inclui visitas guiadas para alunos da rede pública de ensino ao monumento da Diáspora Africana no Maranhão.
O monumento
O Monumento à Diáspora
Africana foi pensado pela Fundação Municipal de Patrimônio Histórico (FUMPH), com
o apoio da
Coordenadoria Municipal da Igualdade Racial (COMPIR), a Secretaria Municipal de
Cultura (Secult) e uma comissão composta de pesquisadores negros das aréas da
antropologia e historia e ativistas dos movimentos sociais negro.
Uma ampla pesquisa foi realizada
pela Fumph e chancelada pela comissão que forrneceu os elementos para compor a
base do monumento, o painel em granito contendo informações históricas e os
oito totens produzidos pelos artistas maranhenses.
“Quando falamos de
territorialidades, sobretudo a negra maranhense não podemos deixar de ressaltar
os territórios quilombolas, que estão presentes em todo o Estado sendo
aproximadamente 860 Identificados e certificados. E em São Luís é importante ressaltar os
territórios negros que estão situados no quilombo Liberdade, constituído pelos
bairros da Camboa, Liberdade, Fé em Deus, Diamante e Sítio do Meio, bem como os
bairros do Coroadinho e a área Itaqui Bacanga, dentre tantos outros que
reforçam esse percentual de negros na capital maranhense. Os territórios
sagrados das religiões de matriz africana estão presentes em todo o Estado do
Maranhão e expressam o elo de ligação ancestral entre o continente africano e o
Brasil, tendo em vista que as memórias, os ritos, as simbologias do sagrado e a
diversidade de práticas dessas comunidades constituem uma cosmovisão e
consciência identitária direta com a África enquanto território ancestral”.
“Por ser uma população expressivamente
negra precisamos ressaltar o quão valorosa foi e ainda é toda a transferência
de saberes que esse povo proporcionou aos locais onde foram obrigados a habitar
em função da escravidão”, ressaltou Kátia Bogéa, presidente da Fundação
Municipal do Patrimônio Histórico (Fumph).
“Vivemos em uma época
onde a reflexão sobre identidade nunca esteve tão em voga. Apoiamos o Monumento
à Diáspora Africana, na Praça das Mercês, local onde atracavam os navios com
pessoas escravizadas, para contribuir com a visibilidade e importância dos
povos de origem africana para a cultura e o patrimônio histórico do Maranhão.
Que este monumento, entregue ao povo maranhense e a todos aqueles que vierem a
São Luís, contribua para refletirmos sobre uma história de colonização e
deslocamentos, violências e resistências decorrentes deste processo, e abra
espaço para pensarmos em um amanhã com novas cores, caras e possibilidades”,
diz Hugo Barreto, diretor-presidente do Instituto Cultural Vale.
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