segunda-feira, 4 de setembro de 2023

FPM: comodismo fiscal de municípios

 


Ganhou destaque nos últimos dias um movimento de prefeituras que alertou para redução de receitas oriundas de repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Esse fundo, que é constituído por 22,5% da arrecadação do Impostos de Renda e sobre Produtos Industrializados, é importante fonte de custeio para os municípios. No Maranhão, muitas prefeituras aderiram a um protesto que paralisou as atividades administrativas não essenciais no último dia 30 de agosto.

Contudo, para se fazer uma avaliação mais consistente da situação é importante examinar a capacidade de sustentação fiscal dos municípios, no caso particular dos maranhenses. Especialmente no que diz respeito à geração de suas receitas a partir da instituição e cobrança de tributos locais (ISS, IPTU, ITBI, taxas, contribuições etc.). Isso de forma a garantir, a partir de seus esforços, pelo menos parte considerável dos recursos necessários para o funcionamento de suas estruturas e o fornecimento de serviços indispensáveis para a sociedade (como educação, saúde e limpeza pública). Um exame nos Balanços Orçamentários, elaborados pelos municípios maranhenses, e disponíveis no site do Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro (Siconfi) do Tesouro Nacional, empresta uma noção razoável de como anda suas arrecadações próprias. Os números são referentes ao quinto bimestre de 2022 (janeiro a outubro – último dado disponível) e dizem respeito aos demonstrativos de 192 prefeituras maranhenses, que apresentaram os dados, das 217 existentes.

O cenário é desolador. Considerando-se todas as receitas desses 192 municípios, até outubro passado, a arrecadação total foi de R$ 19,7 bilhões. Desse montante de receitas, R$ 17,1 bilhões foram oriundos de transferências recebidas (incluído o FPM) de outros entes (Governos Federal e do Maranhão e entidades privadas). Ou seja, dos recursos desses 192 municípios, 87,7% vieram de repasse de outras instâncias e somente 12,3% foram recolhidos localmente. E mais, 70 municípios (36%) não geraram nem 5% de suas rendas por meio de receita própria e 147 prefeituras (76%) não conseguiram obter nem 10% de suas verbas a partir de seus tributos.

As cidades que menos coletaram impostos de sua competência em relação à receita total foram: Bacuri, com apenas 0,22% de receitas próprias; Junco do Maranhão, com 0,44% e, Cachoeira Grande, com 0,70%. Na outra ponta, aquelas que mais arrecadaram localmente, possivelmente por questões específicas, foram: São Luís com 37% de receitas próprias (por ser a maior economia do estado do qual é capital, ter um robusto setor de serviços e uma máquina tributária consolidada); Balsas com 25% (terceira maior economia no estado, sendo impulsionada por seu forte setor agropecuário) e Açailândia com 21,7% (quarta maior economia e dotada de um vigoroso segmento industrial siderúrgico). Aliás, somente essas três conseguem arrecadar 20% ou mais de suas verbas.

Diante desses números podem ser colocadas algumas reflexões, que servem também para a realidade brasileira: (a) deveríamos mesmo ter 217 municípios, se a maioria é sistematicamente dependente de “mesadas” como o FPM e não gera receitas mínimas para se sustentar? (b) não seria mais racional promover um amplo processo de fusão ou incorporação de municípios, assim como fazem as empresas líderes, para alcançar ganhos de escalas, constituir melhores máquinas arrecadatórias e burocracias profissionalizadas mais eficientes, que poderiam oferecer melhores serviços para a população? (c) essa agregação de municipalidades, poderia reduzir drasticamente custos, pois evitaria paralelismo de atribuições e de órgãos de mesma finalidade, além de levar a um providencial enxugamento das máquinas administrativas? (d) a redução no número de municípios abrandaria a necessidade de impostos, diminuindo a carga tributária, o que redundaria em um ambiente mais favorável aos negócios, com ganhos para toda a sociedade? (e) ao fim e ao cabo, o Brasil passou nas últimas décadas por uma desarrazoada expansão na quantidade de cidades, baseada mais em critérios políticos do que em técnicos?

É evidente que aspectos como o nível do dinamismo da economia não devem ser esquecidos quando se fala da possibilidade de cobrar impostos. Contudo, diante de tão baixa arrecadação própria, não se está diante de um contexto de comodismo fiscal? No qual é mais fácil para os municípios, e menos antipático perante a população e eleitores, esperar as transferências mensais de recursos da União e dos estados, em vez de implementar seus tributos (como determina a Lei de Responsabilidade Fiscal), para angariar receitas que vão ajudar a garantir suas atividades? Provavelmente.

Doutor em Administração e Economista - Eden Jr.

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